António Fontinha era um contador de histórias, a quem contaram histórias antes de adormecer. "(...) Durante muito tempo ele lembrou-se dessas histórias e durante muito tempo esqueceu-as, como fazem as pessoas quando acham que chegam a adultos".
Eu, só quero deixar aqui as minhas histórias, de ontem, de hoje e, quem sabe, de amanhã.

04 março 2007

Perfume

Ela nem queria acreditar. Depois de no dia anterior velhas recordações, muito presentes, em demasiadas vezes, certamente mais que as desejadas, a terem deixado completamente fora de si, hoje era o seu perfume que pairava sobre o ar, misturando-se com o cheiro adocicado das pipocas, como que a relembrar-lhe que era um novo dia, mas que os sentimentos da véspera ainda estavam ali, e bem despertos. Ficou completamente inebriada, desconcentrada, o olhar perscrutava em volta, e mesmo no escuro ela sabia que era impossível ele estar ali. Mas, e se...? Não, essa não era uma possibilidade. Os seus sentidos estavam a traí-la, não podia ser, afinal ele já tinha deixado de fazer parte da sua vida. Aliás, nunca chegou a fazer.
No dia anterior, tal como aconteceu em tantas outras vezes, era sexta-feira e já se sentia a liberdade do fim-de-semana. Os corpos transmitiam novos sinais, a troca de olhares sem que ninguém percebesse que aquilo era muito mais que um simples caso de amizade intensificava-se, faziam-se programas para uma escapadela, nem que fosse só com a mente, arma tão forte e destabilizadora. Nada fazia prever que aquele seria o rumo, não naquele dia, não àquela hora e muito menos naquele local, ali tão perto, à distância da simples vontade da loucura. As condições voltavam a estar todas reunidas, mas ela sabia que não podia ceder. Não era a primeira vez, outras houve em que ela própria criou as condições, mas agora era diferente. Tudo mudou. Ou não?

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