António Fontinha era um contador de histórias, a quem contaram histórias antes de adormecer. "(...) Durante muito tempo ele lembrou-se dessas histórias e durante muito tempo esqueceu-as, como fazem as pessoas quando acham que chegam a adultos".
Eu, só quero deixar aqui as minhas histórias, de ontem, de hoje e, quem sabe, de amanhã.

13 janeiro 2007

Escritos na areia

O tempo passa e as páginas começam a ficar mais carregadas com o azul ou o preto, ou até o vermelho menos usual, que dão forma aos pensamentos ou a pequenas anotações para recados de um dia-a-dia em que, muitas vezes, uma página não chega para registar a história.
E é num desses cadermos que tenho um texto teu, ainda antes de me teres impresso aquelas páginas A4 com uma história que poucos conhecem, mas que não te importaste que eu visse. Também tu, tal como eu, anseias pelo dia em que mais do que apenas os nossos amigos possam ler as nossas palavras.
Os três caracóis de carapaça azul, a fazer-me lembrar nós os três, cada um na sua jornada diária, sem saber ao certo o que o amanhã nos reserva, mas com a certeza de que vamos estar sempre por perto uns dos outros, não seguiram viagem e não chegaram a sair da capa do caderno, mas as folhas, essas, com tantas palavras, que nem sempre sairam de lá, ganharam asas e voaram. As sobreviventes encerram em si um bocadinho de mim, um bocadinho de ti e um bocadinho de tantas e tantas pessoas que por ali passaram. Umas passaram e ficaram, e são essas folhas que permanecem neste caderno agora quase despido, ao qual não sei o que fazer.
Ficar agarrada ao passado é não viver o presente e, consequentemente, deixar de construir o futuro. Mas, e as recordações? Aqueles pequenos rebuçados que andam sempre connosco, sem nunca amolecer ou estragar, que nos adoçam e amolecem nos momentos mais amargos? As caixas de papelão canelado que vou guardando no sótão dão lugar às caixas de plástico compradas numa antiga loja dos 300 e nelas sobrevivem recordações de outros tempos, felizes ou não, mas que me marcaram e, mesmo quando a memória me faltar, vão estar ali para sempre.
Este caderno, decido, vai para o papelão. Os contactos são transferidos para a agenda e as anotações de quase um ano de trabalho vão para o lixo. Um novo caderno, de páginas imaculadas, está já a ser preenchido. Neste será difícil ter mais um texto teu, escrito de impulso num dia complicado. Neste será difícil ter mais de mim, a não ser os contactos ou notas de quem comigo se cruza, porque a vida é mesmo assim e temos de ter cuidado com os pequenos segredos que nos acompanham diariamente, ali mesmo à mão dos olhares mais curiosos. Contudo, sei que não há palavras para descrever a amizade e que vais estar sempre aqui!

Um dia um homem chorou. Não era um homem qualquer, nem era um dia comum. E talvez por isso ele chorou. Primeiro uma lágrima, depois muitas até não ter mais o que lamentar. Quando parou de chorar, sorriu e pensou: é assim a vida, umas vezes chora-se, outras ris-e. O bom é que a seguir à lágrimas nada mais pode surgir que um belo sorriso...
RM

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